Era uma tarde fria de quarta-feira quando recebi a mensagem sobre uma veicula??o em mais de 2 milh?es de canais inapropriados. Tratava-se do link de uma notícia do maior veículo de comunica??o do país.
Havíamos passado duas longas semanas abra?ados no tema Sleeping Giants Brasil. Longos calls para debater com anunciantes, veículos e parceiros. Revis?o das políticas de brand safety, double check em todas as configura??es. Foram semanas intensas.
Pensando bem, como poderia a CPMI das Fake News ter detectado em t?o pouco tempo uma lista t?o grande de “CANAIS” inapropriados? Dois milh?es de sites levariam meses para serem avaliados.
Ao entrar na notícia percebo que se tratava de uma fake news. A mensagem do WhatsApp vinha com um título diferente da matéria. O próprio veículo renomado utilizava uma URL amigável fake. Mas, por que n?o ser polêmico e gerar mais visitas? Quantos compartilhamentos adicionais seriam gerados? Na verdade, os 2 milh?es de sites seriam apenas 2 milh?es de impress?es.
Com todo respeito, 2 milh?es de impress?es é pouco. T?o pouco que compramos por mil utilizando CPM como métrica. Olhando a DSP do Google temos acesso a toda internet brasileira, ou seja, quase 80% da popula??o. Olha o potencial disso: a democratiza??o da compra e venda de mídia. Praticamente n?o existem mais barreiras entre quem compra e quem vende publicidade. Segundo o CENP Meios, em 2019 ultrapassamos R$ 2,4 bilh?es veiculados com display e vídeos digitais no país, onde sua maior parte roda nessa modalidade.
A mec?nica criada pelo Sleeping Giants de desmonetizar um site por vez é simplesmente genial. Deixam anunciantes e agências completamente expostos sem qualquer respeito ao trabalho dos profissionais de mídia. No primeiro momento ninguém queria ser envolvido. Seja pausando campanhas, procurando entender o tema ou simplesmente negativando sites. Afinal esse barulho todo foi ao denunciar somente 3 sites.
Precisamos nos acostumar com o tema. Em solo americano a iniciativa já tem quase quatro anos e n?o deve parar t?o cedo. No Brasil, em menos de um mês já estamos com quase 100 anunciantes apoiando e retirando seus anúncios contra poucos que n?o responderam até o momento.
A discuss?o deveria evoluir sobre os critérios utilizados em classificar um veículo como fake. N?o simplesmente em sermos “asfixiados” pelas denúncias de um perfil recém-criado no Twitter. Ainda n?o vejo o mercado publicitário envolvido nesse assunto. Iniciativas como a da Global Disinformation Index, da International Fact-Checking Network ou da agência brasileira de verifica??o Lupa deveriam ter nossos profissionais envolvidos.
Na verdade, se existisse tecnologia pronta para decidir se o conteúdo daquela página é fake news a escolha seria simples. Poderíamos anunciar ou n?o com um simples clique. Os gigantes da tecnologia deveriam acelerar seus esfor?os em sofisticar suas plataformas e suportar nativamente novos mecanismos de controle. N?o se trata de classificar um domínio inteiro como fake news e sim n?o veicular quando o conteúdo da página ultrapassa um risco determinado pelo anunciante. Já temos parceiros de tecnologias que podem ser conectados para auxiliar nesse processo. Mas isso exige expertise e muita discuss?o entre as partes para a correta parametriza??o.
O assunto é sério. Como diz um grande amigo, estamos vendo pela primeira vez “manifesta??es concretas, organizadas e estruturadas contra os algoritmos”. A revolu??o tecnológica da publicidade é fato. As grandes empresas de tecnologia precisam dar transparência na forma como seus algoritmos funcionam. O GDPR e LGPD caminham exatamente nesta dire??o.
Anunciantes e agências precisam rever suas políticas de Brand Safety. N?o devemos parar a discuss?o nas redes de display. Na grande maioria, n?o estamos negativando as redes sociais ou de vídeo que patrocinam um discurso de ódio? ? importante evoluir como indústria e construir a audiência digital em um produto ainda melhor.
Devemos urgentemente construir um selo de qualidade digital. Uma espécie de ISO. N?o é de hoje que trabalhamos com iniciativas como Clean Supply ou SPO (supply path optimization) que visam garantir a qualidade e um caminho de compra mais curto com maior valor para o ecossistema. Precisamos tratar iniciativas como essas com o protagonismo que elas merecem.
Artigo originalmente publicado em: